terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

O Buscador - Jorge Bucay

Mais uma etapa da vida eu cumpri no último dia 19/02 e assim como a história abaixo, me identifico também com ela.
Sou uma buscadora que nem sempre sabe o que está buscando e tampouco se encontrou, mas continua buscando, sempre.
Esta é a história de um homem que eu definiria como um buscador. Um buscador é alguém que procura. Não necessariamente alguém que encontra. Tampouco é alguém que sabe o que está procurando. É simplesmente alguém para quem a vida é uma busca.
Um dia nosso Buscador sentiu que deveria ir até a cidade de Kammir. Tinha aprendido a seguir rigorosamente as sensações que vinham de um lugar desconhecido de si mesmo, então deixou tudo e partiu. Depois de caminhar dois dias por estradas empoeiradas, viu Kammir à distância, mas pouco antes de chegar à aldeia, uma colina à direita do caminho chamou sua atenção. Era coberta de um verde maravilhoso e havia muitas árvores, pássaros e lindas flores. Estava completamente rodeada por uma espécie de cerca de madeira, pequena e polida, e uma porta de bronze o convidava a entrar. De repente, sentiu que se esquecia da cidade e sucumbiu à tentação de descansar por um momento naquele lugar.
O Buscador passou pelo portal e começou a caminhar lentamente entre as pedras brancas distribuídas como por acaso entre as árvores. Deixou seus olhos, que eram aqueles de um buscador, passearem ao redor do lugar … e talvez por isso descobriu, em uma das pedras, essa inscrição “Birre Tare, viveu 8 anos, 6 meses, 2 semanas e 3 dias”. Ficou um pouco surpreso ao perceber que essa pedra não era apenas uma pedra. Era uma lápide, e sentiu pena ao pensar que uma criança tão jovem estava ali enterrada.
Olhando em volta, o homem percebeu que a próxima pedra também tinha uma inscrição. Ao se aproximar para ler, notou: Lamar Kalib, viveu 5 anos, 8 meses e 3 semanas. O Buscador ficou terrivelmente chocado. Este lindo lugar era um cemitério e cada pedra era uma lápide. Todas tinham inscrições similares: um nome e o tempo de vida exato do falecido. Mas o que o deixou espantado, foi verificar que, aquele que vivera mais longo, mal ultrapassara os 11 anos. Embarcado por uma dor terrível, ele sentou-se e começou a chorar.
O zelador do cemitério passava por ali e se aproximou, observou-o chorar por um tempo em silêncio e depois perguntou se ele estava chorando por algum membro da família.
– Não, nenhum membro da família – disse o Buscador – Mas … o que se passa com este lugar? Que coisa terrível existe por aqui? Por que tantas crianças mortas enterradas neste lugar? Qual a terrível maldição que pesa sobre essas pessoas, que as forçou a construir um cemitério para crianças?
O zelador idoso sorriu e disse:
“Você pode se acalmar, não há tal maldição, o que acontece é que aqui temos um costume antigo. Eu direi a você … Quando um jovem completa quinze anos, seus pais lhe dão um caderno, como aquele que eu tenho aqui, pendurado no pescoço, e é uma tradição entre nós que, depois disso, sempre que se gostar intensamente de algo, deve-se abrir o caderno e escrever sobre esse fato: à esquerda, que foi apreciado, à direita, por quanto tempo essa alegria durou. Você conheceu sua namorada e se apaixonou por ela? Quanto tempo essa paixão enorme e o prazer de conhecê-la duraram? Uma semana, duas? Três semanas e meia? E depois? A emoção do primeiro beijo, quanto tempo durou? O minuto e meio em seguida do beijo? Dois dias? Uma semana?
E a gravidez ou o nascimento do primeiro filho? E o casamento dos amigos? E a viagem mais desejada? E o encontro com o irmão que retornou de um país distante? Quanto tempo demorou para apreciar essas situações? Horas? Dias?
Então escrevemos no caderno todos os momentos, cada alegria, cada sentimento pleno e intenso … E quando alguém morre, é hábito abrir seu caderno e adicionar o tempo do que foi apreciado, escrevê-lo em seu túmulo. Pois isso, para nós, é o único e verdadeiro tempo de vida”.
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Tradução: Gustavo Araujo.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

A Ciranda das Mulheres Sábias - Clarissa Pinkola Estés


Uma bênção não faz com que você ganhe alguma coisa, mas, na verdade, faz com que você use alguma coisa - algo que você já possui -, o dom que nasceu junto com você no dia em que você chegou à Terra. Uma bênção é para que você se lembre totalmente de quem é, e faça bom uso da magnitude que nasceu embutida no seu eu precioso e indomável.

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Lira Itabirna - Carlos Drummond de Andrade - A tragédia anuncia, não foi acidente

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“Lira Itabirana”
I
O Rio? É doce.
A Vale? Amarga.
Ai, antes fosse
Mais leve a carga.
II
Entre estatais
E multinacionais,
Quantos ais!
III
A dívida interna.
A dívida externa
A dívida eterna.
IV
Quantas toneladas exportamos
De ferro?
Quantas lágrimas disfarçamos
Sem berro?

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

O menino que ganhou um rio - Memórias inventadas para crianças - Ed. Planeta - Manoel de Barros





"Minha mãe me deu um rio.
Era dia de meu aniversário e ela não sabia
o que me presentear.
Fazia tempo que os mascates não passavam
naquele lugar esquecido.
Se o mascate passasse a minha mãe compraria
rapadura
Ou bolachinhas para me dar.
Mas como não passara o mascate, minha mãe me
deu um rio.
Era o mesmo rio que passava atrás de casa.
Eu estimei o presente mais do que fosse uma
rapadura do mascate.
Meu irmão ficou magoado porque ele gostava
do rio igual os outros.
A mãe prometeu que no aniversário do meu
irmão
Ela iria dar uma árvore para ele.
Uma que fosse coberta de pássaros.
Eu bem ouvi a promessa que a mãe fizera ao
meu irmão
E achei legal.
Os pássaros ficavam durante o dia nas margens
do meu rio
E de noite eles iriam dormir na árvore do
meu irmão.
Meu irmão me provocava assim: a minha árvore
deu lindas flores em setembro.
E o seu rio não dá flores!
Eu respondia que a árvore dele não dava
piraputanga.
Era verdade, mas o que mais nos unia eram
os banhos no rio entre pássaros.
Nesse ponto nossa vida era um afago!"


Esse rio não é meu, mas suas águas e as imagens e todas as sensações sempre me banham, graças a Deus!

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Não te rendas - poeta uruguaio Mario Benedetti

Para começar essa nova história em 2019...
Por tudo e com tudo seremos amor e resistência!
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Não te rendas, ainda estás a tempo
de alcançar e começar de novo,
aceitar as tuas sombras
enterrar os teus medos,
largar o lastro,
retomar o voo.
Não te rendas que a vida é isso,
continuar a viagem,
perseguir os teus sonhos,
destravar os tempos,
arrumar os escombros,
e destapar o céu.
Não te rendas, por favor, não cedas,
ainda que o frio queime,
ainda que o medo morda,
ainda que o sol se esconda,
e se cale o vento:
ainda há fogo na tua alma
ainda existe vida nos teus sonhos.
Porque a vida é tua, e teu é também o desejo,
porque o quiseste e eu te amo,
porque existe o vinho e o amor,
porque não existem feridas que o tempo não cure.
Abrir as portas,
tirar os ferrolhos,
abandonar as muralhas que te protegeram,
viver a vida e aceitar o desafio,
recuperar o riso,
ensaiar um canto,
baixar a guarda e estender as mãos,
abrir as asas
e tentar de novo
celebrar a vida e relançar-se no infinito.
Não te rendas, por favor, não cedas:
mesmo que o frio queime,
mesmo que o medo morda,
mesmo que o sol se ponha e se cale o vento,
ainda há fogo na tua alma,
ainda existe vida nos teus sonhos.
Porque cada dia é um novo início,
porque esta é a hora e o melhor momento.
Porque não estás só, por eu te amo.