sábado, 3 de setembro de 2011

O amor inominável...segundo o escritor português José Saramago. "Filho é um ser que nos emprestam para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos."

Despois de longo e tenebroso inverno, na correria dos afazeres da vida, volto com saudades a escrever e a postar histórias... desta vez, reais. De mulheres, de famílias, crianças, ou simplesmente, histórias de amor... das quais somos impotentes em colocar um "viveram felizes para sempre..." (que pena!)
O que mais aprendo dentre tantas coisas com estas histórias de amor é que somos incansáveis na arte de amar; resilientes na arte de doar e complacentes na hora de receber.
Abaixo um pouquinho das histórias de viva e luta e amor e paciência destas mães e pequenos grandes guerreiros que insistem em brigar (muito mais do que nós) por suas vidas e existências, mesmo na incerteza de um futuro (seja ele de que forma for) entre nós...





A rotina de amor das mães de UTIs
Com filhos internados em unidades de terapia intensiva, elas deixam a vida própria para uma dedicação exclusiva
FERNANDO GRANATO
DIÁRIO SP
   

Elas não têm vida própria. Abandonaram todas as rotinas, como trabalhar e cuidar dos demais filhos, para se dedicar ao bebê internado num hospital.

São as mães de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), cada vez mais frequentes com o avanço da medicina, que tornou casos extremamente graves em doenças crônicas que requerem internações longas, com o uso de sofisticados equipamentos hospitalares.

Elas têm até um grupo no Facebook, denominado Mães de UTI, com 104 participantes (veja ao lado). Estima-se que cada uma das 107 unidades de terapia intensiva de pediatria da cidade de São Paulo tenha pelo menos um paciente crônico, com internação de longa duração. Junto dele, certamente, uma mãe que abandonou sua vida particular para cuidar de seu filho.

O direito de a mãe acompanhar seu bebê na UTI é garantido por lei. Os hospitais particulares que atendem convênios, normalmente, cumprem. Muitos criaram áreas humanizadas dentro das unidades, com brinquedos e móveis confortáveis, nos quais os pais ficam instalados, dormem e brincam com seus filhos. Nos públicos, quase sempre lotados, a realidade é outra. A  SPSP (Sociedade de Pediatria de São Paulo) trabalha para garantir o mínimo de conforto a esses pais.

Alguns hospitais, como o Cândido Fontoura, na Zona Leste, dispõem de armários privativos para os pais guardarem seus pertences, acompanhamento psicológico para familiares e áreas de descanso. "Ainda há muito o que fazer, mas já temos grande avanços", avalia o médico Renato Lopes de Souza, presidente do departamento de terapia intensiva da SPSP. "É preciso cuidar dos pais, afinal, as internações em UTIs são momentos de muita ansiedade e angústia vividos pelos familiares."

Muitas vezes, os pais, principalmente as mães, ficam morando na UTI junto com o filho. Tomam banho, fazem as refeições e dormem no hospital.  "Nós estimulamos a participação intensa dos pais, como auxilio no processo de recuperação dessas crianças", diz a coordenadora médica da UTI de pediatria do Hospital Sírio-Libanês, Lucília Faria.

Lucília salienta que é preciso cuidado com o aspecto psicológico dessas mães, que muitas vezes ficam sobrecarregadas emocionalmente com a experiência vivida. A médica não esquece o caso de uma mãe que ficou "internada" três meses com o seu bebê. A criança acabou morrendo e a mãe não suportou. "Ela nos disse que ia junto com o filho", contou Lucília. "Achamos que ela estava dizendo que ia acompanhar o corpo da criança até o enterro, mas não. Ela atravessou a rua, foi até o último andar do prédio em frente ao hospital e se atirou da janela."

80 
hospitais da cidade têm UTI

Estudo listou a existência de 107 unidades de terapia 
Uma dissertação de mestrado defendida na USP pela médica Daniela Carla de Souza listou 107 unidades de terapia intensiva pediátrica ou neonatal em 80 hospitais em São Paulo.

Áreas com maior população têm menos UTIs
O estudo mostrou uma distribuição irregular dessas UTIs na cidade. Os núcleos com menor população possuiam
o maior número de unidades e vice-versa.

Existe uma UTI para cada 2.728 pacientes 
A tese levantou a existência de 969 leitos de UTI pediátrica na cidade. Um leito para cada grupo de 2.728 pacientes. O número médio de leitos operacionais por unidade foi de 11,7.

Patricia e o "guerreiro" Bernardo. Três cirurgias, hemodiálise diária e uma lição de vida para médicos e funcionários do Hospital Infantil Sabará


Grupo troca experiências no Facebook
A fotógrafa Daniela de Cássia  Frison, 34 anos, costuma dizer que fechou a sua vida para balanço desde o nascimento de seu filho Rafael, portador de uma síndrome incurável, há seis meses.

"Posso até ficar doente, que não vou perceber. Todos os  meus sentidos estão voltados para o Rafael", diz. Ela passa os dias dentro da Unidade de Terapia Intensiva de pediatria do Hospital Sabará, no Centro. Só sai de lá para uma rápida passada em casa,  na hora do almoço, quando encontra a filha Giovana, de 4 anos. "Ela é muito ligada a mim e está sofrendo com a minha ausência", lamenta-se.

O trabalho também foi relegado. Especialista em fotografar e filmar festas de aniversário de crianças, Daniela tem passado os trabalhos para outros profissionais e apenas administra o negócio, com a ajuda de um laptop, nos momentos em que Rafael está dormindo. Sua maior expectativa no momento é a de que seu seguro saúde financie a instalação de um aparato  médico-hospitalar de grande intensidade em sua casa, o chamado home care, para que ela possa ficar junto de seus dois filhos.

O mesmo desejo tem a guia de turismo Patricia Schneider, 37 anos, mãe de Bernardo, de 9 meses. Ela está "internada"  junto com ele desde o seu nascimento, quando foi detectado um grave problema renal, e está separada da outra filha, Beatriz, 5 anos. Patricia a  vê  apenas nos finais  de semana.

Bernardo ganhou fama entre os médicos e funcionários do Sabará, tal a sua vontade de viver. Ele já passou por três cirurgias, retirou os dois rins, faz todos os dias hemodiálise, um tratamento que consiste na remoção de substâncias tóxicas do sangue com um rim artificial, e está sempre sorridente.  Patricia fica sempre ao seu lado e dorme apenas três horas por noite.

Patricia e Daniela encontram conforto e informação junto a outras mães que estão na mesma situação, no grupo Mães de UTI, na rede social Facebook. Ali, elas comemoram conquistas e apoiam-se mutuamente nos momentos de dor. "Que delícia ficar com o colo cheio! Ainda mais com essas princesas lindas finalmente juntas em casa. Parabéns, vocês merecem", diz uma das postagens, referindo-se ao caso de uma menina que depois de sete meses de internação numa UTI de pediatria voltou para casa  junto da mãe e da irmã.

Em outro comentário postado, uma mãe reproduz a definição de filhos, segundo o escritor português José Saramago. "Filho é um ser que nos emprestam para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos."  Essa mesma mãe acrescenta que é preciso ter coragem, principalmente para a dor da perda. "Eles não são nossos. Recordam-se? Foram apenas emprestados.."

Um comentário: