segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Menino Lua, fica a dica!!

Uma sanfona, um bolo de banana e a vontade de fazer chover

‘Menino Lua’, inspirado nas canções de Luiz Gonzaga, é um espetáculo musical ingênuo e cativante, com elenco inspirado

Por Dib Carneiro Neto - atualizada em 16/08/2013 10h03

Cena do espetáculo 'Menino Lua' (Foto: Ronaldo Gutierrez)
Fernanda Maia é um dos nomes que têm despontado com muita força no cenário paulistano de teatro para crianças e jovens. ‘Canção de Amor em Rosa’, seu premiado musical anterior, reunia canções de Noel Rosa. Agora é a vez de ‘Menino Lua’, que retrata o universo dos baiões de Luiz Gonzaga, o Gonzagão. O próximo texto, para encerrar uma trilogia, já foi anunciado: Fernanda vai se debruçar sobre os mineiros do Clube da Esquina. Vamos aguardar ansiosamente.

Em ‘Menino Lua’, assim como também ocorria no caso anterior de Noel Rosa, a autora e diretora Fernanda Maia não quis realizar um espetáculo biográfico. Como Noel, Gonzagão comparece não com sua história real de vida, mas em um espetáculo inspirado nas letras de suas canções mais conhecidas. Muitos e muitos trechos de letras, como de Asa Branca ou Assum Preto, são ditos pelos atores no meio dos diálogos, perfeitamente integrados ao enredo. Isso causa uma inevitável empatia no público, sobretudo nos adultos, que se deliciam com as referências ao mundo dos xotes, baiões e xaxados.

O elenco é simplesmente primoroso. Estão todos no registro certo da prosódia nordestina, além de demonstrarem um vigor e uma agilidade incríveis. O casal de protagonistas – Thiago França, como o menino Lua, e Vivian Bertocco, como sua namoradinha Rosinha – é sensacional. Tem carisma e tem talento. Os dois nos fazem rir e nos emocionam o tempo todo, sem pieguices, mas com muita garra e muita segurança na difícil missão de transmitir ingenuidade e esperteza ao mesmo tempo. Ambos conseguem.

Os coadjuvantes – Aretê Bellar, Cy Teixeira, Felipe Ramos, Rodrigo Caetano – explodem em cena a cada aparição, muito bem caracterizados seja como um grupo de fugitivos ou como uma família de retirantes ou, ainda, na pele de personagens impagáveis como Mané Onça, Beato Baltazar, Lindaura, Arupemba e Capitão Zé de Toti. Os figurinos de Zé Henrique de Paula são marcantes, apoiados basicamente em materiais como couro, chita, alpercatas e lenços. O mesmo artista assina a bela cenografia, baseada na projeção em telões de imagens fotográficas da seca do Nordeste e na reprodução de uma típica residência nordestina, com seus oratórios e lampiões. Não falta nem uma árvore seca encravada em pleno teatro. O público é convidado a se deslocar por três ambientes diferentes, sempre na boa companhia da sanfona do menino Lua. Destaque também para a acertada iluminação de Fran Barros.

O enredo: Lua é um menino muito atrapalhado, mas excelente sanfoneiro, que deseja ser músico quando crescer. Asa Branca, seu pássaro de estimação, sem ter água para beber, morre, deixando o menino inconsolável. Por causa disso, ele desiste de seu sonho de ser sanfoneiro e se lança, com a ajuda da amiga Rosinha, na missão de acabar com a seca no sertão. É muito boa a sacada da dramaturgia de Fernanda Maia, que faz o personagem principal negar sua música o tempo todo, achando ingenuamente que sua arte não salvará seu povo. Preste atenção na divertida referência a certo “bolo de banana da tia Estela”: você será convidado a prová-lo no meio do espetáculo e vai morrer de rir com a brincadeira que os atores farão em torno disso.

Você e sua família terão também de prestar bastante atenção nos longos trechos (talvez longos demais) em que os atores cantam à moda dos repentistas, pois muitas informações sobre o enredo estão contidas nesses momentos de cantoria – e se você se distrair, perde as letras e o fio da meada. De qualquer forma, Menino Lua é um ótimo espetáculo, daqueles em que o talento transborda e em que o teatro se mistura à música e à poesia em nome da mais pura e singela emoção. De quebra, a boa exploração da dicotomia ‘medo X coragem’ faz dela uma peça altamente recomendável para seus filhos pequenos. Não perca.

SERVIÇO:
Teatro do Núcleo Experimental. Rua Barra Funda, 637, tel. (11) 3259-0898. Duração: 50 minutos. Lotação: 40 lugares. Sábados e domingos às 16h. Ingressos: R$ 20,00 (inteira) R$ 10,00 (meia). Até 08 de setembro.
Dib Carneiro Neto (Foto: Acervo Crescer)

Dib Carneiro Neto é jornalista, dramaturgo (Prêmio Shell 2008 por Salmo 91), crítico de teatro infantil e autor do livro Pecinha É a Vovozinha (DBA), entre outros. Escreva para ele: dib.colunista@edglobo.com.br

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